Um show de bizarrices

Os acontecimentos da última semana, a par da sua gravidade, evidenciaram, nas redes sociais, um show de insanidades, sandices e assemelhados. Sou professora licenciada em Letras e atuei – nas disciplinas de português e literatura - como docente no ensino médio e no ensino superior, considero-me, pois, suficiente habilitada para refletir sobre o assunto.

Vimos, em muitos locais, caminhoneiros exibindo faixas em que pediam a intervenção militar imediata. O governo central satisfez-lhes a vontade e decretou, legalmente, um instrumento constitucional – Garantia da lei e da ordem - que permite às forças armadas, às polícias usarem a força contra os caminhoneiros, tomarem posse dos seus veículos e retirarem-nos de rodovias e mesmo dos acostamentos. Isso é intervenção militar feita na prática, mas muitos defensores da dita intervenção militar – analfabetos políticos - não se deram conta que estavam provando o seu próprio veneno. Aos velhos caquéticos que enganaram os mais novos afirmando que os tempos ditatoriais eram melhores só restou rezar para que não houvesse confrontos e mortos – é que no tempo deles, dos velhos caquéticos e mal informados, não havia televisão e internet detalhando a violação dos direitos de trabalhadores e fazendo-o ao vivo.

Pseudo-formadores de opinião meteram-se de pato a ganso e, como costuma acontecer nessas ocasiões, não deu certo. Verdadeiros analfabetos políticos e econômicos, incapazes de ler e interpretar uma notícia de jornal, alguns indivíduos puseram-se a discutir a redução da alíquota de ICMS por parte dos estados. Coitados, desconhecendo a Lei Kandir, quiseram tirar leite de pedra, desprovidos de argumentos, eles passaram a usar textos que apenas confirmavam os argumentos que tentavam refutar. Torna-se constrangedor observar tais situações, porque elas depõem contra quem as protagoniza, mas também porque constituem uma perda de energia para quem tenta equacioná-las. Há muita informação e pouco conhecimento em movimento nas redes sociais. “Eu tenho provas do que digo”, mas se tem, “amiguinho”, prove-o! No reino das palavras, que é uma rede social, não adianta esbravejar ou bravatear, argumentos sólidos, consistentes, são imprescindíveis. O resto é balela!

Ainda há os comentadores desprovidos de reflexão, eles comentam...Sem ler o que estão comentando, movidos apenas pelo ódio partidário, pela aversão a uma determinada ideologia que imaginam estaria expressa em um determinado texto. Expressam com uma estonteante clareza o seu analfabetismo funcional, demonstram que juntam letras, mas não sabem extrair-lhes significados, sentidos... Ficam com palavras soltas na mente e, não sabendo o que fazer com elas, “vomitam-nas” de maneira desconexa.

Haveria muito mais, mas o rescaldo da semana, a par de todas as consequências sociais, econômicas, políticas, foi-me positivo: “Professora, agora, eu começo a entender a sua impaciência com certas pessoas”; “Professora, a senhora tava certa, como é difícil extrair lógica com pessoas que não conseguem estabelecer um raciocínio lógico”. Lembrei aos amigos, aos ex-alunos uma frase atribuída a Nelson Rodrigues e que sempre me causou temor: Os idiotas vão dominar o mundo, não porque eles tenham capacidade para tal, mas porque eles são muitos. E eu confesso que ando com a nítida sensação que se reproduzem em escalada geométrica.

Bem feito, Umberto Eco já tinha nos avisado que os imbecis iriam tomar conta das redes sociais... aos pouquinhos, vamos nos refugiando em outros espaços, “mais arejados”, menos toscos, salvam-nos Instagram, LinkedIn, Twitter...por lá, a interlocução ainda é feita em alto nível.

Professora Elaine dos Santos

Doutora em Letras

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