Sobre conhecimento e humildade

Em 1998, eu estava no terceiro andar (quarto 301 ou 302) do Karlton Hotel em Caçapava do Sul, cidade em que trabalhava como docente do Curso de Letras da URCAMP, quando o telefone tocou. Era a professora Rosane da COPERVES/UFSM, ela precisava de uma professora de língua espanhola para, ao lado da professora Luciana Montemezzo, assumir a banca de elaboração de questões para PEIES e vestibular da UFSM e eu fora a pessoa indicada pelos professores do Curso de Letras da UFSM. Eu não tinha dois anos como docente, havia concluído a graduação em 1997, recém pensava preparava-me para o mestrado. Aceitei, sempre fui movida a desafios e tinha a confiança dos meus ex-professores.

A Luciana havia sido minha professora e a COPERVES, com uma organização interna invejável, mobilizou um staff para me dar subsídios para, naquele ano, elaborar as provas do PEIES I e PEIES II. Depois que a prova estava elaborada, eu passei por uma arguição sob os diferentes aspectos contemplados na prova, sobre o que poderia ter sido objeto de questões, o que não havia sido pedido etc. – era incrível ver que eles dispunham de um controle sobre questões difíceis e sobre questões que efetivamente selecionavam, porque, afinal, não é a questão difícil que seleciona, uma vez que questões difíceis podem induzir o candidato ao erro e, assim, todos errarem a questão difícil. Na sequência, a problematização dizia respeito à estrutura linguística das questões formuladas ou ao que se conhece como “raiz” da questão. A pergunta é sempre: O que, efetivamente, tu queres perguntar e o que, efetivamente, tu estás perguntando. De resto, as respostas precisam ser verossímeis, não se admitem “pega ratões”, não se podia induzir o candidato ao erro, isso é considerado um gesto falso e, portanto, injusto com aquele que se dedicou durante um ano para o concurso vestibular.

Cerca de três a quatro meses depois dessa etapa, mesmo depois que eu tinha 10, 12 anos de experiência, todos passávamos pelo revisor de questões. Um professor que desconhecia a nossa prova, um professor com mais experiência que nós, um professor crítico, preferentemente, no meu caso, com vivência em língua espanhola fora do Brasil, problematizava a minha prova. Depois da leitura, das críticas, das observações feitas por esse professor que, em tese, sabia muito mais que eu, detinha muito mais conhecimento que eu, humildemente, eu era sabatinada novamente. E não havia qualquer melindre nisso, éramos professores trabalhando em prol do conhecimento, trabalhando por um concurso em que se prima pela lisura, pela transparência e pela equidade de oportunidades entre os alunos.

Ser elaboradora e, depois, revisora de questões de provas objetivas para o concurso PEIES e o concurso vestibular, assim como contar com todo o apoio técnico da COPERVES/UFSM, foi um grande diferencial na minha vida pessoal e profissional. Entre 1998 e 2010, atuei na elaboração de questões para a prova de língua espanhola e, entre 2001 e 2013, fiz parte das bancas de avaliação das redações dos concursos PEIES e vestibular, sempre como convidada, como cargo de confiança, agreguei um inominável “know-how” ao meu currículo Lattes, mas aprendi muito sobre conhecimento, avaliação, paradigmas de aprendizagem em tantas reuniões, seminários, oficinas, coisas que a gente leva para a vida, mas que, às vezes, é preciso dizer para as pessoas, principalmente, quando os ignorantes nos cobram a humildade que eles não têm. A vida não é feita apenas por aquilo que aparentamos, a vida é feita também pelas colheitas que fazemos distantes dos holofotes e que nos fazem seres humanos melhores, porque fazemos a diferença para quem precisa de nós.

Professora Doutora Elaine dos Santos

Currículo Lattes disponível em  http://lattes.cnpq.br/9417981169683930